Entre o clássico estilo sonoro da Vanguart e o novo momento de experimentações mais maduras e com menos instrumentos, Intervenção Lunar, sexto álbum de estúdio da banda formada por Helio Flanders, Fernanda Kostchak e Reginaldo Lincoln chega ao mundo. Entre composições escritas antes da pandemia e as reflexões feitas após o início da crise sanitária, o grupo traz um trabalho sólido e bonito aos fãs.
Por precisar de menos elementos para compor os arranjos, a experimentação entre as sonoridades de cada composição só foi possível por conta da experiência dos músicos, que conseguiram entregar um trabalho a cara da banda, mas com menos instrumentos. Intervenção Lunar foi produzido com o apoio de Fabio Pinczowski e recebe os músicos Kezo Nogueira (bateria, percussão), Pedro Pelotas (órgão, piano), João de Pierro, que tocou as violas em Suas Coisas Favoritas, e Felipe Ventura, que fez arranjos de cordas e tocou violino e viola em Canção Para o Sol. Para a capa, os músicos escolheram uma foto do acervo da fotógrafa Nina Bruno que conversa, diretamente, com o refrão da faixa-título.
Realizado entre dezembro de 2020 e fevereiro de 2021, Fernanda destaca a estranheza do momento em que não foi possível abraçar os amigos de banda. “O disco foi todo produzido durante a pandemia e não deixamos em nenhum momento de cuidar de nós mesmos e também um do outro, seja nos cuidados sanitários, no doloroso isolamento e distanciamento social, seja nos cuidados do emocional coletivo, imagina a gente se encontrar depois de tanto tempo longe e não se abraçar? Foi no mínimo estranho, mas entendemos que isso nos protegeria e também às pessoas do nosso convívio, além de ser o que deve ser feito em situação de crise sanitária”. Para Reginaldo, o drama foi outro. “Foi a única gravação de disco que não teve churrasco. A pandemia atrapalhou as festinhas. (risos)”.
Leia a entrevista completa com a Vanguart:
Lindie: Como vocês estão se sentindo com “Intervenção Lunar” vindo ao mundo?
Helio: Esses lançamentos de álbuns autorais não acontecem sempre, então sempre é uma sensação nova. Desde 2017 (Beijo Estranho) que não temos um grupo de canções inéditas como agora, então é uma expectativa enorme pensar na recepção disso. Ao mesmo tempo, estamos mais maduros, conhecemos a nós mesmos e ao nosso público, então aguardamos com tranquilidade a recepção.
Regi: Alívio por termos sobrevivido ao caos da pandemia e poder retribuir com arte, com vida. Essas canções têm uma carga emocional forte e bonita.
Fernanda: Olha, como tudo desde o início da pandemia, traz um sentimento complexo, existe uma alegria imensa em apresentar algo que veio de nós, mas existe um estranhamento em lançar música, algo tão íntimo e importante na vida humana no momento mais incerto que nossa geração já viveu até hoje.
Lindie: Como foi a decisão de fazer um disco mais intimista e distante, ainda que tenha elementos em comum, do que foi apresentado em Beijo Estranho?
Helio: Depois de anos viajando com o show Acoustic Night foi uma coisa natural, já estávamos naturalmente íntimos no palco, tocando as canções quase de improviso, de tanto que já conhecíamos nossas ações, então decidimos tentar imprimir isso no álbum. A parte boa de ter menos integrantes é que a troca fica mais afiada.
Lindie: Como é o processo de composição de vocês? Todos compõem?
Regi: A gente sempre compôs juntos ou separados. Não há regras. Para esse álbum as canções já chegaram mais prontas individualmente e é sempre interessante observar como as canções se transformam em canções “do Vanguart” assim que a gente as toca juntos.
Lindie: Fernanda, como foi escrever, pela primeira vez, uma canção sozinha para a Vanguart? E, além disso, como é interpretá-la no disco?
Fernanda: É a primeira vez que escrevo uma música estando no Vanguart e para o Vanguart. Anterior a isso tenho algumas coisas no campo instrumental e que nunca foram lançadas, sequer mostrei pra alguém, mas foi um movimento natural desde que comecei a cantar um pouquinho nos shows e no disco de versões que fizemos do Dylan, por exemplo. Eu sentia que em algum momento eu iria querer dar texto para as melodias que sempre foram o meu fazer musical mais espontâneo. Então, trouxe essas melodias e letras para trabalhar com a banda e descobrir a sonoridade que ela já trazia consigo [aqui, Fernanda se refere a composição de Lá Está, escrita por ela já no instrumental] e como tomaria forma surgindo da nossa vivência como grupo que faz/toca música junto já há algum tempo. A nossa afinidade, principalmente nas referências em comum que temos, foi fundamental para dar a atmosfera que a música transmite. Eu particularmente espero que nossos fãs curtam tanto quanto eu curti dar mais esse passo com o Vanguart.
Lindie: O projeto carrega a participação de várias pessoas, como foi a troca entre todos?
Helio: Chamamos músicos que já estavam conosco na estrada, como o Kezo Nogueira, que além de tocar conosco desde 2018, também gravou nosso último disco Vanguart Sings Bob Dylan. O Pedro Pelotas também havia feito alguns shows conosco. Felipe Ventura veio da vontade de ter um arranjo de cordas diferente, como as belas coisas que ele fez com sua banda Baleia. O João de Pierro também já havia tocado conosco.
Regi: Temos esse espírito de banda, a gente gosta de tocar com outras pessoas. Essa troca e tudo o que se aprende é impossível de se aprender em uma faculdade.
Lindie: Vocês também se envolvem na parte de produção e masterização? Como ocorreram as escolhas dos arranjos de cada faixa?
Helio: Os arranjos acontecem naturalmente. Depois de tanto tempo juntos, a gente sabe quando algo vai funcionar ou não. Basicamente, se estamos sorrindo, o arranjo funcionou.
Regi: De um modo geral estamos envolvidos em todos os processos do álbum ativamente. Desde a produção, arranjo, gravação, mixagem e masterização. Eu tenho estúdio em casa, gravei coisas pontuais do álbum em casa, muitas ideias de arranjo surgiram assim, a gente tem autonomia total para chegar onde queremos com as canções.
Lindie: Ainda que distinto do último álbum, o disco tem a assinatura sonora da Vanguart. Como vocês se sentem com uma identidade sonora tão sólida?
Helio: Sempre gostamos de artistas que, por mais que mudem seu som, continuam tendo personalidade. Pra nós sempre foi natural, e fomos evoluindo juntos dentro do que pensamos ser uma concepção atual para nós.
Regi: Interessante pensar que existe essa identidade já que a gente nunca pensou nisso. Ela sempre existiu, desde o primeiro álbum a gente já não soava como as outras bandas. Esse disco é sem dúvida uma evolução nesse sentido, a gente teve menos elementos, menos instrumentos e conseguimos imprimir essa identidade.
Fernanda: É o som que sai da gente, então ficamos felizes em saber que o que é a nossa essência mais pura é o que dá essa "assinatura" para nossa sonoridade.
Lindie: Por que vocês escolheram separar o material em dois discos?
Regi: As canções ganharam mais força assim, elas dialogam entre si com mais proximidade agora, contam essa história com mais detalhes e mais profundamente.
Helio: Conceitualmente pensamos que uma Intervenção Lunar ocasionaria um Oceano Rubi, e assim, de fenômenos em fenômenos, astrológicos e naturais, queremos contar uma história. Paralelamente, ficamos muito tempo sem lançar material, então achamos que vai ser bom que a coisa venha aos poucos para o público.
Ouça Intervenção Lunar: